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Números podem não mostrar a realidade da violência contra idosos 3n6d

Trabalhos da Ufal atualizam boletim epidemiológico da violência e cartilha sobre dignidade da pessoa idosa 6v6d7

Por Manuella Soares / Ascom Ufal 14/06/2025 00h23
Números podem não mostrar a realidade da violência contra idosos
Professora Margarida Maria dos Santos, ao centro, e estudantes no lançamento da Cartilha Envelhecer com Dignidade, no Junho Violeta do Governo do Estado - Foto: Ascom Ufal

De 2019 a 2023 foram registrados 823 casos de violência contra idosos em Alagoas. Os dados estão no Boletim Epidemiológico feito sob a coordenação da professora Elizabeth de Souza, do curso de Enfermagem da Ufal, e foram extraídos em abril deste ano por meio do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS). Mas os números acendem um alerta sobre quais informações relevam, de fato, a realidade do Estado.

“A notificação da violência é algo muito velado e a subnotificação acontece por vários motivos: não identificação dos sinais de violência pelos profissionais, insegurança ou medo destes de notificar, por às vezes residir próximo dos agressores - no caso das ESF, devido ao rodízio intenso de profissionais nas UBS, o que dificulta a manutenção dessa norma e, às vezes, a própria pessoa idosa não se reconhece como vítima de uma agressão e tem medo de denunciar a família”, destaca a professora Elizabeth, que faz parte do Grupo de Pesquisa Multiprofissional sobre Idosos da Ufal (GPMI).

O documento elaborado pela docente junto com alunas da Ufal contextualiza que a Organização Mundial da Saúde estabelece o marco cronológico de 60 anos para definir o início da velhice em países em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. O avanço da idade e o acúmulo de condições crônicas expõe as pessoas a partir dessa faixa etária, segundo o Ministério da Saúde, ao aumento da dependência funcional, tornando o idoso mais suscetível a situações de vulnerabilidade e diferentes formas de violência, como negligência, abusos físicos, emocionais e financeiros.

Os recortes sociodemográficos dos dados obtidos já mostram situações preocupantes, mas o grupo alerta para a preocupação com a necessidade de ter números mais consistentes. Um dos exemplos é quanto ao local das ocorrências. A residência foi apontada em 428 casos e a via pública em 24, por outro lado, 263 ocorrências foram registradas como “local ignorado”. O mesmo acontece no recorte de escolaridade das vítimas, onde o item “ignorado” (450) supera até Ensino Fundamental Incompleto (158) e Analfabeto (122), como os mais identificados no banco de dados.

“Devido ao número elevado de notificações com informações ignoradas é evidenciado a necessidade da educação permanente dos profissionais da saúde para uma melhor realização das notificações, tendo assim intervenções bem-sucedidas. Com isso, é de extrema importância as políticas públicas serem aplicadas integralmente com o envolvimento da educação, saúde e assistência social voltada para a causa da pessoa idosa, combatendo assim as diversas violências contra os mesmos”, destaca o Boletim.

Números apresentados 4k1y70

De acordo com o trabalho realizado pela Ufal no Boletim Epidemiológico de caracterização da violência contra a pessoa idosa em Alagoas no período de 2019 a 2023, a Violência Física possui um maior índice nas notificações de casos (681), seguida de Violência Psicológica ou Moral (173) e Negligência e Abandono (72). O banco de dados também registrou casos de Violência Financeira, conhecida como Patrimonial (38), Violência Sexual (35) e Tortura (19).

“A baixa incidência desses dois últimos tipos pode estar relacionada à subnotificação, especialmente pela vergonha, medo de represálias ou dependência emocional e financeira da vítima em relação ao agressor”, alerta o documento.

Os dados também fazem um recorte sociodemográfico e mostram que as pessoas do sexo masculino e de cor parda é a população que mais sofre violência. A caracterização da vítima e do agressor apontada nos registros evidencia que a maioria dos casos está associado ao ambiente familiar, sendo filho, amigos/conhecidos, e cônjuge os mais indicados como agressores, nessa ordem. “Isso induz a necessidade de trabalhar a dinâmica intrafamiliar e a reavaliação das estruturas de apoio e proteção”, conclui a professora que coordenou o trabalho.

Para Elizabeth, “a violência, sob qualquer modalidade, retrata o nível de desenvolvimento alcançado por uma sociedade. E, em se tratando de violência contra as pessoas idosas, é possível se afirmar que tal sociedade está adoecida. É imperioso que nós, como sociedade, saibamos identificar esse mal e em que nível de gravidade está, para poder agir”.

Ação efetiva da Ufal 3a5oy

Um grupo de 17 estudantes do curso de Serviço Social da Ufal, liderado pela professora Margarida Maria dos Santos elaborou um material para sensibilizar e orientar a população sobre as diversas formas de violência capazes de afetar as pessoas idosas. A cartilha Envelhecer com Dignidade foi apresentada na abertura da campanha Junho Violeta, em parceria com a Secretaria de Estado da Cidadania e da Pessoa com Deficiência (Secdef).

“Espero que essa cartilha alcance o maior número de pessoas promovendo o conhecimento e mobilizando ações concretas em defesa dos direitos de uma pessoa idosa. Que ela sirva como instrumento de apoio, tanto para as pessoas idosas quanto para os seus familiares, cuidadores e profissionais das redes de proteção. Eu desejo que o conteúdo contribua para fortalecer as denúncias, romper o silêncio sobre as violências sofridas e ampliar a consciência coletiva sobre a necessidade de envelhecer com dignidade, respeito e segurança”, afirmou a estudante Geovanna Patrícia.

A Cartilha é fruto de um trabalho sério e profundo do grupo, durante a disciplina Ações Curriculares de Extensão. “Nós temos feito esforços no sentido de firmar esse espaço da extensão relativo ao tratamento da questão do envelhecimento populacional. A grande preocupação é como a extensão pode fazer com que a Universidade não esteja somente formando profissionais, mas também há preocupação com a formação de profissionais cidadãos. E a questão do envelhecimento, ela tem chamado muita atenção”, defendeu a professora Margarida.

Além de abordar as diversas formas de violência, o material busca a sensibilização para os sinais de alerta, e informa sobre os direitos da pessoa idosa, os canais de denúncia dos órgãos que atuam na defesa dos direitos da pessoa idosa e das legislações que as protegem.

A Cartilha também orienta sobre a recente alteração das placas de estacionamento prioritário e considera que a antiga imagem que fazia referência à pessoa idosa era etarista, reforçando a ideia de dependência. O modelo atual dispõe da imagem de uma pessoa ereta com a inscrição 60+. O material feito pelos alunos ainda reitera a importância de articulação entre as áreas de saúde, assistência social, educação e segurança pública.

Mais que uma experiência acadêmica 3t1621

Durante o processo de elaboração da Cartilha Envelhecer com Dignidade os estudantes puderam refletir sobre a importância do respeito, da empatia e do cuidado intergeracional. Eles tiveram o a documentos importantes e ouviram profissionais que nortearam o debate, além do contato com histórias reais e dolorosas.

“Poder participar da execução desta cartilha foi uma experiência enriquecedora e de grande responsabilidade social. Ccomo foi citado na cartilha: ‘Respeitar a pessoa idosa é respeitar o próprio futuro’, sintetiza que reconhecer e respeitar a pessoa idosa e seus direitos é fundamental para garantir o a esses direitos no futuro e lutar por um mundo sem idadismo/etarismo”, destacou a estudante Ana Luiza Vanzan.

E a aluna Evelyn Caroline acrescentou que a experiência “foi uma imersão profunda na realidade vivida por essa população”. Ela enaltece que o valor inestimável de entregar um produto como esse: “Ele permite que o conhecimento acadêmico ultrae os muros da universidade e se torne ação, intervenção e resistência. É sobre devolver à sociedade um trabalho comprometido, ível e necessário”.